Parceria
14. O falar é prata, o calar é ouroSilêncio é ouro. É tentador ficar de conversa na parada, mas você queimará um tempo precioso dando detalhes minuciosos de como passou pelo crux. Mecha-se e deixe a conversa para a caminhada da descida ou pro bar, mais tarde. Esse é um dos items em que mais se perde tempo, sem se dar conta. Já gastei infinitas horas em paradas, tirando infinitas fotos, comendo, checando o visual, etc. Esqueça isso, ou faça isso enquanto faz a seg do parceiro. Não fique desocupado.
Em se tratando de comunicação durante a escalada, independente da forma adotada (fala, gritos, apito, puxões na corda), mantenha-a simples e mínima. Eu não sei o palavreado usado no Brasil, mas aqui fora a coisa é mais ou menos assim:
- Seguro! O líder chegou na parade e se ancorou
– Fora da seg! O seg indica ao líder que ele está livre
(O líder puxa toda a corda até chegar no seg)
- Sou eu! Seg indica que não tem mais corda pra puxar
– Na seg, suba quando pronto Líder indica que o parceiro está na seg e pode escalar
– Escalando! O segundo está subindo
Em um ambiente alpino onde você muitas vezes não pode ver nem ouvir seu parceiro, qualquer coisa além disso irá causar confusão. Limitando-se ao básico você sempre saberá o que está acontecendo, e não irá perder tempo tentando entender o que o outro está dizendo.
Quando o seu parceiro assume a liderança, sua única opção é dar segurança e esperar. Não há porque perguntar como ele está indo, se está muito difícil, se está fácil, ou se ele acha que está seguindo a via correta. Por outro lado, quem se compromete na liderança assume que ou vai pra cima, ou cai. Claro, também pode-se tentar desescalar se a coisa ficar feia, e nesse caso seu parceiro deverá estar atento para o fato da corda estar sobrando cada vez mais, e ir tirando conforme ela afrouxa, mas no geral, como dizem por aqui, “é mandar ou morrer”, e nada irá tornar isso mais rápido ou fácil. Seus gritos apenas irão tirar a concentração do líder.
Gritaria incomoda os outros, incomoda os animais e incomoda toda a natureza. Se as condições não permite o uso de voz, você irá precisar de outra forma de sinalizar. Uma que eu uso frequentemente é puxões na corda. Funciona mais ou menos assim:
(3 puxões do líder) O líder chegou na parade e se ancorou
(3 puxões do segundo) O seg indica ao líder que eles está livre
(O líder puxa toda a corda até chegar no seg)
(3 puxões do segundo) Seg indica que não tem mais corda pra puxar
(3 puxões do líder) Líder indica que o parceiro está na seg e pode escalar
(3 puxões do segundo) O segundo está subindo
Esse sistema funciona bem em vias onde as costuras de proteção não apresentam muita angulação. Nas enfiadas em que o arrasto é muito grande, a energia dos trancos é simplesmente dissipada ao longo da corda. Walkie-talkies podem facilitar nessas situações.
15. Mover-se junto
Esse é uma habilidade que se desenvolve com experiência, então praticar muito em terreno fácil é o ideal. Sua habilidade e confiança irão ditar que tipo de terreno vocês estão preparados para se mover junto, e a natureza do terreno irá influenciar no comprimento de corda entre vocês. Tudo uma questão de compromisso – você nunca estará 100% seguro, mas a idéia é que você estará mais seguro do que se estivesse solando, e mais rápido do que se estivesse escalando proteção por proteção.
A técnica final em mover-se sozinho envolve usar praticamente toda a corda sob terreno técnico, que seria normalmente protegido. Prussics podem ser usados nas costuras alpinas de forma a proteger o segundo caso ele caia, e para prevenir o líder de ser arrancado da parede, caso ele caia. Outros extensores são colocados com moderação enquanto você desafia conservar seu rack e aumentar a distância que podem escalar antes de se reunirem em alguma parada. Essa é uma ótima técnica para se praticar em couloirs que possuam eventuais protuberâncias, porque o arrasto da corda é muito pequeno.
Em ambiente alpino existe situações em que uma simples cordada não é suficiente para permitir que o seu parceiro chegue a parada, ou mesmo pela natureza da rocha as locais que permitem proteção também estão mais acima. Nessas circunstâncias pode ser necessário que o seg seja forçado a mover-se junto com o líder por alguns metros, até que o líder possa-se fazer seguro. Fique atento a esse tipo de situação e planeje como sinalizar isso para o seg, ou você pode se ver precisando de alguns poucos metros de corda e seu parceiro estará lá embaixo encordado na parada, sem ter idéia alguma.
16. A Regra dos 5 Minutos
Esse é uma idéia tirada da escalada em big wall. Em longas cordadas em artificial o líder irá gritar “5 minutos!” qunado ele está a menos de 10 minutos da parade. Isso alerta o seg para se preparar para escalar, vestir a sapata, guardar qualquer tralha que esteja fora da mochila, etc. Embora desnecessário usar esse grito em cordadas curtas, o ideal é que o seg esteja pronto para subir antes mesmo do líder chegar a próxima parada.
17. Guiar em blocos
Em vias longas, considere guiar em blocos. Essa técnica é envolve a mesma pessoa guiar 4 ou 5 cordadas de uma vez, antes de alternar a liderança com o parceiro. Mentalmente, 4 ou 5 blocos são mais fáceis de lidar do que 25 trocas de lider porque
• O líder pode ficar totalmente focado no seu bloco, e o segundo pode relaxar e descansar por algumas horas. O líder pode estudar e prepar-se mentalmente para a próxima cordada, o que pode ajudar à acelerar a navegação. Ninguém fica parado por muito tempo, então ambos se mantêm quentes;
• Se pouco equipamento foi usada durante a cordada, a troca de tralha fica muito rápida porque o segundo apenas precisa passar o que foi recolhido ao invés de ter que passar todo o rack;
• De antemão elaborem um sistema e mantenham-no até o final. O seg vai levar a mochila mais pesada? Quem leva o topo? Vocês vão trocá-lo conforme trocam a liderança? E a comida e água? Vão revesar?
18. Trocando a tralha
Na parada, mntenha a troca de equipamentos rápida e eficiente. Três minutos poupados em cada troca irão poupar uma hora em uma via com 20 cordadas, o que pode ser a diferença entre cervejas na cidade ou a noite sentado na a corda.
Um sistema eficiente pra pendurar o rack ajuda muito, um gear-loop pode ser útil pra passar as peças de um pro outro. O gerenciamento de corda também é crucial, e se você estiver guiando em blocos a corda precisará ser re-rempilhada de forma que a corda que vai para o líder esteja novamente pra cima. Com um pouco de prática (e ajuda de um auto-blocante) você pode começar a re-empilhar a corda assim que o segundo estiver cerca de 5-10m abaixo de você. Quando ele chegar a maior parte da corda estará organizada, com apenas os últimos metros deixados do lado errado e separados em outra pilha.
Quando se sobe alternando a liderança, as transições são o que mais consomem tempo. O objetivo é ter todo o time em sincronia, ambos escaladores trabalhando juntos para manterem-se movendo. Alguma idéias para facilitar:
- Levar uma fita ou um gear-loop. Se cada escalador levar uma fita e utilizá-la para colocar as peças, de maneira organizada, conforme limpa a cordada, ao chegar a parada tudo o que deve ser feito é passar o molho para o líder, que precisa apenas pegar o resto das peças que faltam, ao invés de ter que pegar todas as peças uma a uma.
Se você está de segundo em uma via muito difícil, pode ser interessante deixar as peças clipadas na corda bem perto do seu harness ao invés de gastar seus dedos tentando organizar a peça no rack.
- Dividir e compartilhar. Trocar de blocantes com o seu parceiro salva tempo em não precisar clipá-lo a ancoragem. Isso funciona melhor se você estiver dando seg de um auto-blocante (reverso, atc guide, …) clipado num ponto central fora do seu harness. Quando o segundo chegar na parada, trave a corda no blocante com um azelha (faça um backup, como por exemplo clipar uma costura entre a “orelha” do nó) por exemplo, e enquanto seu parceiro organiza o rack, pegue o atc/reverso dele e coloque-o novamente em seg a partir do seu loop da cadeirinha. Bloqueie seu novo atc, e agora você pode desfazer o nó e retirar o primeiro reverso/atc e entregar de volta a seu parceiro antes que ele comece a subir.
19. Navegação
Adote um senso comum quando estiver procurando a rota. Por exemplo, aqui na Inglaterra os guidebooks são ultra detalhados, descrevendo cada metro da via. Os guias dos Alpes, pelo contrário, podem acomodar em um único parágrafo um quilômetro vertical inteiro, então é importante que você interprete isso corretamente. Use a informação para guiá-lo, mas esteja pronto para dar um passo para trás e perguntar-se “se essa fosse a minha via, por onde eu seguiria?”. Isso quase sempre resolve problemas de navegação, e se não, não hesite em olhar mais atenciosamente antes de comprometer-se. Cinco minutos de exploração podem salvar horas de tempo perdido lutando com a linha errada.
20. O caminho traçado apenas conduz pra onde foram os outros
Especialmente durante a alta temporada, as chances de você estar compartilhando uma via, ou seguindo o rastro de alguém, são bastante grandes. Eles podem estar na sua linha, mas também podem estar indo para outro lugar, eles podem até mesmo estar perdidos e indo para o lugar errado. Confie no seu instinto. Use o rastro como forma de se orientar e facilitar sua escalada (evitar ter que refazer degraus na neve/gelo, por exemplo) mas não fique obsecado a ponto de parar de checar seu topo e seguir cegamente. Aprenda a não contar com um caminho já traçado para sentir-se seguro, e conseguir manter o nível quando ele não estiver disponível.
21. Guiar-se por proteções pré colocadas
Assim como você não deve ficar obcecado por rastros de outros grupos, não fique obcecado com proteções pré-colocadas. Não encerre a cordada prematuramente, só porque você encontrou uma parada no meio do caminho. Muitas vezes eu assumi, apenas porque passei por um bloco equipado com cordeletes e bolts, que a cordada terminava naquele ponto e, ao invés de esticar mais a corda e subir mais alguns metros, encerrei minha escalada antes, perdendo tempo (mais uma parada, mais uma trocação de equipo, etc).
22. Escalar toda a corda
Tenha uma imagem mental do que são 60 metros, ou do tamanho da sua corda. Quando guiando, aprenda a “saber” o quanto de corda extra você ainda tem, e procure sempre utilizá-la ao máximo. Ao invés de confiar cegamente em paradas já armadas, que muitas vezes podem acabar encurtando a cordada, aprenda a montar suas paradas quando conveniente, e a confiar nelas. Cordadas esticadas resultam em menos cordadas, menos tempo trocando tralha, mais rapidez na subida.
23. Se hesitar, irá atrasar
Se o movimento parece muito difícil, ficar parado analisando não irá fazê-lo mais fácil. Medo, hesitação, pensar em excesso, tudo isso custa tempo, deixa bombando, gasta energia. Avalie o estado de suas proteções, avalie se o medo é real, e aja de acordo. Na grande maioria das vezes você está seguro, mas mesmo assim estará hesitando por medo de cair (de forma segura), ou pelo simples incômodo da exposição. A prática regular da escalada/montanhismo, e a busca por escalar no seu limite (e cair) irão facilitar e muito o processo de tornar-se um escalador mais decidido.
Roupas
24. Menos é maisTirar e colocar roupa demanda tempo. Você para, tira a mochila, tira as merdas todas, se arruma, põe a mochila de volta, … Antecipar é a melhor forma de poupar tempo. Se você está diante de uma longa caminhada, saia do abrigo com menos roupa, passe um pouco de frio, e poupe ter que tirar as mesmas roupas quando, em quinze minutos, você estiver fervendo. Esse mesmo raciocínio se extende para outros equipamentos, comida e água.
25. Fique calçado
Continuar usando sua sapata entre as cordadas irá poupar um tempo enorme durante a escalada. Não existe nada mais irritante do que escalar com alguém que insiste em ficar tirando a sapata a cada cordada. Essa é normalmente a mesma pessoa que não vai estar com a sapata pronta quando você acabar de descer da primeira via esportiva do dia. Ao invés de estar pronto, o cara via estar relaxando ou olhando o guidebook, e agora que é hora de escalar, ele não está pronto. Como você vai “voar” as cordadas e vias desse jeito?
Quando você vai escalar, indepentemente de você estar guiando, fazendo seg, ou fazendo nada, é sua responsabilidade estar pronto.
Proteções
26. Proteger excessivamenteMuitas vezes, sob o calor do momento, se é tentado a colocar-se mais proteção do que você realmente precisa, sob a falsa crença de que a proteção abaixo de você irá falhar, mesmo sabendo que abaixo está um sólido nut, por exemplo.
Se a coisa está ficando preta, obviamente que você precisa proteger mais, porém, muitas vezes é interessante puxar um pouco mais, e achar um lugar mais conveniente e confortável para colocar a próxima peça. O segredo é obviamente saber (e confiar) que sua proteção é boa ou não, e isso vem com experiência.
Lembre-se de que você pode escalar uma via protegendo a medida em que você sente medo ou faz dá um esticão, ou você pode escolher proteger nos lugares que decidir serem melhores e mais cômodos. A segunda é uma maneira mais proativa, ao contrário da primeira, reativa, que diminui o controle de sua escalada e suas chances de sucesso.
27. Aprenda a colocar proteções bomba
Se você quer escalar rápido, precisa aprender a colocar proteçõe sólidas, a prova de bomba. Nada menos que isso irá servir. O equipamento utilizado para proteger a cordada e a parada, precisa ser perfeito.
Apenas após escalar muito e colocar muitas proteções de forma rápida e eficiente, você estará qualificado para escalar rápido vias em que você coloca sua própria proteção. Parte de estar seguro ao escalar rápido diz respeito a ter o conhecimento, experiência e julgamento para avaliar a confiabilidade das suas peças. Nada compromete mais sua segurança do que suas proteções.
28. Use fitas para ancoragens rápidas
Se estiver fazendo várias cordadas em esportiva é interessante deixar prontas fitas para as ancoragens. Monta umas duas fitas, cada qual com dois mosquetões de rosca nas extremidades, e clipe-os como uma costura alpina no seu harness, juntamente com mais dois outros mosquetões (sem rosca). Ao chegar a parada, tudo o que você precisa fazer é clipar cada um dos mosquetões em um bolt, fazer a “magic x”, e clipar os dois mosquetões sem rosca no ponto mestre do seu “magic x”, e já era. Clipado e pronto pra ser baixado.
Esse set-up também function perfeito para vias tradicionais onde as parades tem bolts. Assim você rapidamente põe seu parceiro na seg ao invés de perder tempo usando a corda para se conectar a parada, e a inversa também ocorre: quando seu parceiro termina a cordada, a corda dele estará livre e pronta para ser usada. Nada de desfazer nós ou retirar corda da ancoragem.
Alternativamente pode-se usar duas costuras para efeito similar, mas é interessante usar ao menos um mosquetão de rosca conectado ao ponto central da equalização, ou como ponto principal de clipagem da ancoragem.
Em uma via de várias cordadas em que há três ancoragens para equalizar, leve um cordelete com os mosquetões de rosca já conectados. Novamente, clipe os mosquetões nas ancoragens, equalize o cordelete e clipe-se ao ponto central com sua daisy. Se quiser adicionar redundância adicional, pode-se clipar um pedaço da corda na ancoragem principal com uma volta do fiel, que não fica tão difícil de desfazer quando tensionado, quanto um longo e demorado nó oito.
29. Cams ao invés de nuts
Carregue um bom rack de cams em vias longas, eles são muito mais rápidos de colocar e retirar em granito do que nuts ou hexes. Seu parceiro precisa apenas apertar o gatinho para liberá-lo (ok, as vezes eles também emperram, mas muitas vezes porque foram enfiado fundo demais). Cams como os Black Diamond Camalots ou Omega Pacific’s Link Cams tem um maior espectro de abertura do que outros cams, então você precise levar menos números.
Também fique atento para proteções fixas que podem ser usadas rapidamente para proteger ou criar uma parada. Lembre-se sempre de chegar o estado dos pitons, bolts, fitas, etc.
30. Use uma daisy chain
Se você está fazendo uma via de várias cordadas, mesmo que várias cordadas esportivas, use uma daisy chain para clipar-se a ancoragem ao invés da corda. Isso poupa tempo na hora de limpar a ancoragem e trocar a tralha.
Ao chegar ao topo da via, ou subir até a parada nos jumares, é muito mais rápido e prático clipar a daisy do que adicionar nós extras ou tralhas que tomarão ainda mais tempo para serem desfeitos.
Isso é recomendável apenas para escaladores experientes que conhecem seus sistemas de segurança e limitações. Se você está começando, é interessante clipar-se a ancoragem com a corda antes de fazer a segurança de seu parceiro. A daisy pode ser perigosa se usada incorretamente.
Se em uma via de várias cordadas a sua primeira proteção for a prova de bomba, você pode clipar sua daisy nela e rapidamente começar a dar segurança para o segundo, enquanto se encarrega de colocar proteções extras e equalizar todo o sistema com uma fita ou cordelete.
Referência / Bibliografia
Speed Climbing!, 2nd: How to Climb Faster and Better (How To Climb Series), Hans Florine (Author), Bill Wright (Author)http://www.climbing.com/, Seções ‘Skill’ e ‘Tech Tips’
Autor: Murilo Lessa
Murilo Lessa é natural de Piracicaba e desde 2008 mora em Londres, na Inglaterra. Analista de Sistemas, também pratica canyoning, trekking, e é piloto de paraglyder. Se dedica a escalada e ao montanhismo desde 2009, e faz mil malabarismos para balancear treinos e ambições egoístas com a família e o trabalho.http://blogdescalada.com/30-ideias-para-apertar-o-seu-passo-vertical-parte-2/
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